domingo, dezembro 24, 2006

3 de Outubro de 2004, Domingo, 14h31m (casa)

Dia de desporto televisivo.

Acordo cedo, tendo em conta que o meu objectivo prioritário é ver o FC Porto-Belenenses, que só começa pelas 19 e 15 horas, transmissão na TVI. Claro que existe esse pequeno particular do almoço e a compulsão de ler os jornais.
Seja. Aproveito para assistir ao Campeonato do Mundo de ciclismo. Resolvo assistir à prova no Holmes Place, a pedalar com os craques, frente ao plasma. Vejo em A BOLA que o final da transmissão do Eurosport está previsto para as 16 horas. Bom horário. Desta vez não me vou deixar surpreender. Perdi o GP do Qatar (motociclismo) por falta de informação.
Chego ao Holmes por volta das 15 horas, já equipadinho com os meus recentes calções pretos almofadados na zona tomatal. Pedalo em roda livre, nada de andamentos altos. Pedalo durante cerca de uma hora. Os craques em Verona (belo traçado, belas paisagens), eu nas Avenidas Novas. Mamei um litro de água. Convém.
Ao meu lado, uma chavalinha de uns 20 anos pedala em bom ritmo. É toda ela bonita. Não tira os olhos do chão a olhar para mim. Está toda equipada de preto e o meu coração fica de luto, devido à sua indiferença. Deve ser um bocadinho vaidosa, porque até as luvinhas pretas condizem com o equipamento. As luvinhas pretas não são necessariamente úteis no ciclismo. Mas dão imenso jeito na musculação. Pois é, agora elas também já puxam pelo cabedal.

Reparo que ambos abanamos os ombros no mesmo ritmo. Não adianta nestum, mas sempre é um prémio de consolação. Pelo espelho gigante do clube vejo as boazonas a aproximar-se das bicicletas ou das passadeiras. As bicicletas estão na “pole position”, mesmo em frente ao espelho. Atrás de nós ouve-se o barulho característico das solas dos ténis a friccionar a borracha (ou lá o que é aquilo) das passadeiras. Apetece-me virar os cornos para trás de cada vez que se aproxima uma boazona. Pelo espelho dá ideia de que são mulheres virtuais, tipo Lara Croft. Por outro lado, dá para trocar olhares de forma mais desinibida, se for caso disso. É como se tudo fosse um jogo fora da realidade. O Domingos Amaral (para quem não saiba, o gajo é filho do Freitas do Amaral, mas o estilo de escrita é algo diverso) fez um editorial na revista Maxmen a dizer que os tugas olhavam muito e abordavam pouco. Faço parte desse escalão otário.
E mesmo assim sinto-me privilegiado. Olhar é um enorme prazer. Eu é que sei o que foi estar quase um mês na Arábia Saudita, durante o Mundial de Futebol que os putos ganharam em 1989. Mulheres eram um bem raro. No regresso (Campeões! Campeões! Portugal! Portugal! Portugal!) à pátria, voámos primeiro até Amesterdão, pela KLM. Quando a hospedeira holandesa fechou a cortina para mudar de roupa da cintura para cima, um camarada jornalista pediu educadamente, com olhinhos de cocker spaniel engripado:
— Não feche, por favor. Estivemos um mês em Riade.
Ela riu-se e fechou a cortina. Profissional, não é? Para me vingar da falta de álcool em Riade, pus-me a beber Heineken de urgência e a mistura caiu-me mal com o peixinho. No free-shop de Amesterdão andei a vomitar um bocado. Mas em grande estilo. Cada vez que fechava a porta do WC saía um jacto de perfume. Assim (quase) dá gosto chamar ao gregório.
Estava sem dormir há dia e meio e o meu aspecto era um bocado mau. Era pior estar sentado do que a andar, dada a exaustão. Passei o free-shop a pente fino. Tínhamos seis horas antes de embarcar para Lisboa. O meu aspecto era tão mau que se puseram a inspeccionar a nota com que paguei umas revistas de automóveis.
Bem, voltemos ao Holmes.
Sinto-me ignorado de forma uniforme por todas as miúdas do clube.

Um dos monitores está também interessado no Mundial de Ciclismo. Trocamos alguns comentários.
— Então e os portugueses?
— Parece que o Pedro Cardoso vem no grupo do José António Flecha, a minuto e meio da frente — esclareço.
— E os outros?
— Ainda não ouvi nada. Devem ter desistido. A Itália já perdeu o Bettini.
— Quem é que está a puxar?
— O Izidro Nozal e o Mancebo estão a controlar. É um Espanha-Itália, com tendência Espanha.
No sprint final ganhou o Óscar Freire, sem surpresa e com mérito. Foi o tri do menino e a segunda vitória em Verona. Quero ir para a piscina, mas estão a dar uns planos bonitos de Verona. Fico a ver. Classificações dos portugueses... é mentira. Até aos 25 primeiros nada a assinalar.


16h45m (piscina)

Entretive-me na conversa e só cheguei à piscina à hora do lanche das pessoas normais. Meto-me na água. A temperatura está impecável. Quase ninguém ocupa as três pistas. A profundidade assusta-me (metro e vinte bem medidos), mas sei que é difícil afogar-me.
A água nas orelhas chateia-me um bocado e passo a vida a enfiar a touca. Mas vou melhorando. Estou eu muito bem a nadar de costas e a olhar para o tecto (podiam colocar páginas de BD no tecto, assim a malta nadava de costas e dava para ler uns álbuns em slow motion) quando entra uma boazona de fato de banho azul-escuro. Fica-lhe bem, porque tem os olhos azuis.
Dá-me na caixa dos pirolitos e vou buscar halteres de latex. E fico para ali a saltitar na minha faixa de rodagem, tipo pardalito, simulando indiferença à presença da boazona. Irrita-me que os regulamentos do clube obriguem a fato de banho inteiro. Se os bikinis fossem permitidos, seria um festim! Tipo concurso Hawaian Trophy ou assim!
Bem, a boazona é muito branquinha e matulona. A juntar aos olhos azuis. Penso: deve ser mais uma sócia ucraniana ou russa. Nestes casos, deve-se proceder como nas passagens de nível sem guarda: “Pare, escute e olhe. Um comboio pode esconder outro”. Atrás de uma boazona costuma vir um namorado. O tempo médio da distância de segurança é de cinco minutos, porque as miúdas entram por um balneário e os homens por outro. Outra regra estúpida do Holmes Place.

Lá vem o namorado. Pouso os halteres e ponho-me a nadar com as pernas a rodar à ciclista. Um truque que aprendemos na hidroginástica. O casal está abraçado num dos topos da piscina. Vou-me aproximando devagarinho, para ouvir o diálogo. Só para confirmar a língua que estão a falar. A uns dez metros ainda não dá para tirar conclusões. O som do russo é parecido com o do português. Lá me vou chegando. Afinal são portugueses. Já vejo russos e ucranianos por todo o lado.
Vou para o jacuzzi, que está quase vazio. É importante ter cuidado quando se frequenta um jacuzzi. A palavra deriva da soma dos termos Jack com Uzzi. O jacuzzi é uma mistura de Jack Daniels com uma metralhadora Uzzi. Quem não tolerar o álcool e não souber nada de armas deve abster-se de frequentar o jacuzzi.
Fico poucochinho tempo: meia-hora.
Tomo duche e regresso a casa. Ligo para a Sport TV e o Chelsea do Mourinho está a carregar sobre o Liverpool. Sei mais tarde que acabaram por ganhar por 1-0. O Mourinho estava crispado. Olha a novidade! Como não ouvi dizer nada, presumo que tenha conseguido acabar o jogo sem ser cuspido por adeptos do Chelsea ou do Liverpool. Mas se isso acontecesse não viria mal ao Mundo. Ele considera as escarretas como um facto menor.


18h30m (Galeto)

Almoço no Galeto. Creme de tomate. Ovos mexidos com cogumelos, uma dose de batatas fritas. Regresso a casa e vejo o FC Porto-Belenenses. Os dragões lá ganharam 3-0, mas o Belém deu muita luta. O Diego andou quase todo o jogo discreto. No final abriu o livro, com meia-dúzia de toques de magia. Ver o FC Porto jogar está a fazer-me mal. Por um lado, como sportinguista, acho um piadão às derrotas do FC Porto (um fenómeno que só acontece no futebol, nas modalidades já não sou assim), por outro lado gosto de ver jogar os artistas da Invicta. O Baía lá continua com umas saídas à “99”, que era a agente secreta que trabalhava com o Olho Vivo. “Don Adams é Get Smart”. E depois fechavam-se portas atrás de portas, antes da habitual luta entre Kaos e Control, as duas organizações que tratavam do Mundo na altura.
Hoje sabemos que o Saddam e o Bush fornecem argumentos muito mais improváveis.


21h45m (Pasta Caffe)

Sai uma lasanha e um crepe de chocolate. Ponho-me a passear a seguir ao jantar. Vou até ao vídeo-clube. Já voou o “Intimidade”, do Patrice Chéreau, que estava em venda directa. Deve ser um bocado seca, mas parece que a Kerri passa a vida no truca-truca. Vi a menina numa curta-metragem do “Indie 2004” e fiquei com vontade de galá-la toda nua.
Regresso a casa na exacta altura em que o Simão Sabrosa marca um golo ao Palatsi. Aquilo deixou-me um bocado triste. O Benfica lá acabou por ganhar. Amanhã joga o Sporting. Fé? Mais um empate. O Rui Santos está na SIC Notícias a dizer que o Rochemback está gordo.
Mudo de canal e apanho com um grande plano do Castelo Branco. É verdade, começou a “Quinta das Celebridades”, na TVI. Rendo-me. Da outra vez tinha jurado que não via o primeiro “Big Brother” e não consegui. A partir do pontapé do Marco, o “Big Brother” até invadia os noticiários. Há ainda motivos suplementares. A Fátima Preto está a entrar agarrada ao Avelino Ferreira Torres. Vejo a montagem de apresentação da Fátima Preto e mando um SMS para Deus, a dar-lhe os parabéns pelo belo trabalho. Quer dizer, não foi um trabalho completo, mas foi o que se pôde arranjar. A Júlia Pinheiro perguntou à Fátima se ela se considerava uma loura tradicional e a miúda trocou-se toda. Se fosse na série “Pesquisa”, com o Doug McClure e o Anthony Franciosa, havia uns aparelhos todos modernaços que até davam o bater do coração e percebia-se que os maus estavam à brocha. O Alexandre Frota a olhar para a Fátima Preto até se babava todo. Estava a ver que a Júlia Pinheiro ainda entrava de serviço à esfregona.
Depois a emissão passou para o puto Vasconcelos, que conseguiu comer uma cenoura a meias com um cavalo. O truque é giro, mas o chaval ainda não era nascido e eu já fazia a mesma coisa com o meu cão. Com algumas variantes. Eu fazia o truque com gressinos e íamos progredindo os dois simultaneamente. O “Beauty” tinha mau feitio e queria sempre comer mais gressino que eu. Bastava acentuar uma expressão gananciosa com o meu olhar que o cão queria acelerar o ritmo e acabava engasgado na maior parte das vezes, para não se armar em campeão. Comer gressinos é uma arte que não está ao alcance de todas as raças.

Mudo para a SIC e estão outra vez a gozar com o “Ídolos”. Às tantas entra o Fernando Rocha e manda as caralhadas da praxe. Olho para o relógio: 23h47m. Gosto do puritanismo da nossa sociedade. A SIC pode passar caralhadas antes da meia-noite, desde que seja para combater a “Quinta das Celebridades”. Mas o “Cabaret da Coxa” tem de estar num gueto, porque é mal-comportado. Por outro lado, sabe-se que a TVI é realmente uma TV de inspiração católica. Por isso podemos considerar a “Quinta das Celebridades” como a antecâmara do Inferno.
Não nego que gostei de ver os vestidos da Mónica, da Fátima Preto e da Cinha Jardim. Estavam com um “glamour” digno de filme porno de alta produção. Não percebo como deixaram entrar a Pimpinha Jardim para o estúdio. Ou a miúda veio à boleia ou eles não têm amor à limusina em que chegaram os convidados.
Gramava ver a Kate Bush no programa do Herman. Mas não há pachorra para esperar. Venho para o computador e ponho-me a escrever o diário. Isto sim, é um trabalho digno. Temas sérios, fundamentados, análises à sociedade portuguesa, investigação. Resumindo: pedagogia humanista.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Bom Natal Homem...

Tou a gostar do que estou a ler ;)

8:37 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ora ainda bem. Muito obrigado, Tiago.
Material não falta, embora já tenha dois anos.
Foram três meses da minha vida muito curiosos, acelerados, humanamente enriquecedores.

9:15 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Esqueci-me de agradecer e retribuir as Boas Festas.
Pronto...
Para todos, já agora...

9:16 da tarde  

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