quarta-feira, dezembro 19, 2007

7 de Dezembro de 2004

Agustina em grande forma na Gulbenkian

15h05m - Entro na Gulbenkian, já atrasado para assistir ao painel das 14h30m do segundo e último dia de “A língua portuguesa: presente e futuro”, uma iniciativa que teve a presença constante do Jorgito dos Bilhares, quer dizer, o nosso PR Jorge Sampaio, que só arredou pé da primeira fila do auditório 2 às 16 horas e 9 minutos, tempo módico de Green Witch.
Tinha consultado o programa do colóquio e interessava-me ouvir o primeiro painel da tarde. Quando começo a descer as escadas depara-se-me o inimaginável. Há gente sentada nas escadas de madeira, tipo filósofos gregos. No átrio, um ecrã gigante transmite o que se passa no auditório 2. Mais tarde venho a saber que ainda existem mais dois pequenos auditórios a cobrir o acontecimento em directo. Tanta gente interessada pela Língua Portuguesa e eu para aqui a maltratá-la!
Bem, como estava desconcentrado com a comunicação de Agustina Bessa-Luís (era só malta a subir e a descer as escadas), resolvo tentar entrar no auditório 2 antes de começar a intervenção seguinte. Foi muito fácil. Identifiquei-me como jornalista e fiquei repimpado da Silva na cadeira encostada à parede da segunda fila da frente. Pois é, não há nada como ser um gajo importante.
Isabel Alçada (capa do JL no dia seguinte) falou, entre outras coisas, do tratamento do sexo na literatura infantil. E concluiu que “chegar à grande literatura é um processo lento e longo. Há uma interacção da aprendizagem da leitura e da escrita”, reforçando que no estrangeiro a leitura é intensiva. Gastão Cruz foi igualmente interessante, tendo citado Ruy Belo quando afirmou que um médico nunca deixava de ser médico por ser mau profissional. Mas um poeta, se fosse mau poeta, perdia essa qualidade.
Ondjaki, indiscutivelmente uma espécie de José Luís Peixoto de carrapito, no que toca ao afecto feminino, frisou que “a língua é a língua de uma onda gigante que aí vem. E eu vou mais fazer uma instalação do que ler um texto”. Não topei instalação nenhuma. De resto, a Gulbenkian já está muito bem servida de instalações.
Fora de brincadeiras (porquê, sim, porquê?) o homem é bom e tem o dom da palavra: “O maleável não pode ser amarrado. Uma língua grávida pode parir culturas”.
No entanto, mesmo em boa forma, Ondjaki não pode nunca competir com o espírito subversivo de Agustina, que levantou o estádio da Gulbenkian por várias vezes:
“A hostilidade é profundamente erótica. Reprimir pode inspirar. A culpa é inspiração. O exercício do pecado é o caminho de todos os tempos. O homem é violento para se afirmar. A mulher não precisa da violência para nada. Basta-lhe a maternidade. Mas só com mulheres no mundo a ser mães ainda estávamos na Idade da Pedra. Foi a inveja do Homem que permitiu o desenvolvimento da sociedade”.
Inspirado pela Agustina, fui o primeiro a levantar o braço para a breve sessão de perguntas, limitada a quatro questões pelo Professor Carlos Reis, moderador do painel, outro dos motivos que me levou ao estádio.
— Diga o seu nome, por favor.
Claro que não desperdicei a oportunidade do trocadilho com a famosa peça “Português, escritor, 45 anos”.
— Luís Graça, português, escritor, 42 anos.
Logo ali cativei a assistência. E lá perguntei à Isabel Alçada se um puto que vai à meia-noite para uma enorme bicha, só para comprar o último Harry Potter enquanto está fresquinho, pode vir a dar num leitor de Sophia de Mello Breyner ou António Lobo Antunes.
Carlos Reis agradeceu-me a brevidade. Eu não pergunto para me exibir. Só pergunto quando quero saber qualquer coisa. Estava eu a começar a falar novamente, quando o moderador me disse amigavelmente:
— Não estrague...
Esclareci apenas que tinha sido aluno dele via TV, no Propedêutico de 1979/1980. Acabava sempre as aulas com a frase: “Nada mais por hoje. Até à próxima lição”. E usava uma barba estilo Alexandre Herculano. Cá fora, depois da sessão, trocámos breves palavras, ao lado de Inês Pedrosa, Nuno Júdice e Manuela Júdice. Foi aí que encontrei o meu amigo Prol, com quem intercambiei demorados olhares, prenhes de fraternidade cúmplice.
Anh? O kékefoi? A resposta da Isabel Alçada? Pá, ficou assim numa onda de nunca se sabe. O futuro só a Deus pertence.

17h26m - Depois de um pequeno passeio pelos jardins, para tomar ar, regresso para a sessão de encerramento, prevista para as 17h30m. Mas já tinha começado. Não há dúvida de que foi um congresso estranho. Muita gente, painéis adiantados...
Vou para o auditório 3. A Lídia Jorge estava a falar, sentiu-se mal, teve de abandonar o palco. Depois veio o Prado Coelho, que agradeceu à maltosa toda e passou a bola ao Rui Vilar. E depois eu dei de solex e comprei três postais do José de Guimarães e um catálogo da exposição, a que não tiraram o controlo electrónico e que se pôs a apitar à entrada do El Corte Inglés. Comprei o “Fada Láureas” para dar como presente na Tertúlia BD de Natal.
Cheguei à TBD (primeira terça do mês, já sabem) e o FC Porto estava a jogar com o Chelsea, no Dragão. Fiquei de frente para a TV, mas sempre a falar com a malta. O André Carrilho foi um dos distinguidos na sessão. Depois fomos até ao Foxtrot. No caminho (de boleia com o meu amigo Álvaro Santos) fiquei na conversa com outro elemento bastante fresco, o Pedro Alves. A namorada é professora e nas aulas sobre sexualidade sai-lhe cada pitéu que é de um gajo ficar de cara à banda. Um puto de 15 anos confessou sentir alguma culpa por se masturbar na sala, ao lado da avó, a ver o canal 18. Mal a avó adormece, ele muda para o Canal 18 e orienta-se. Mas o acto provoca-lhe uma sensação de culpa.
Mas nem só de rapazes vivem os desabafos. Uma miúda esclareceu que se sente bastante perturbada com a actividade sexual dos pais. A cabeça da mãe bate na cabeceira da cama e o “bang-bang” sensual deixa a nossa adolescente uma bocado perturbada. Obrigado! Ouvir os pais a foder à maluca é sempre traumatizante para qualquer terráqueo. Muito mais nestas idades complicadas.
O Foxtrot fechava às 3 da manhã, para variar.
Comi dois cachorros (agora não estou a falar de zoofilia, foi dos outros), bebi dois S. Francisco sem álcool e a noite findou com o Lino frustrado por se ter desconcentrado na snookerada com o Álvaro Santos.
Vim para casa de boleia com o António, a quem prometi fotocópias dos artigos de jornal com as críticas ao concerto dos Ena Pá 2000.
Adormeci pelas 8 da manhã.

4 Comments:

Blogger Unknown said...

Curioso, acerca descrição que faz do Plato's, um amigo meu comentou-me que havia agora um espaço em Lisboa assim, que apareceu na Time Out, senão me engano. Confirma-se?

12:34 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não vi a Time Out, mas nunca ouvi falar disto.
De qualquer forma, estou um bocado "reformado" das noites, porque o dinheiro se acabou e os projectos literários e de espectáculos deram-me apenas "lucro vivencial".
Grande abraço.

9:46 da tarde  
Blogger Unknown said...

É de facto uma pena que este projecto tenha ficado a meio. Decerto que uma compilação da oferta sexual da noite escrita desta boa forma divertida seria um "nicho (de mercado) muito bem preenchido". Eu seria o primeiro leitor e ofereceria um exemplar a todos os meus amigos merecedores de presente. Por outro lado o alvo de mercado estaria restringido aos homens que sabem ler. Por favor retoma este projecto. Alguma editora há de ter o bom senso.

11:18 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Obrigado pelo apoio.
O livro está on-line e o que não me falta são contactos de pessoas em editoras. Se ninguém lhe pega há três anos...é porque não quer.
Isto para mim está morto e enterrado. Até mesmo o diário que está a sair tem muitas gralhas e era um esboço, embora com alguma revisão.
Há um dia em que explico que comecei a escrever para a Oficina do Livro e depois fiquei sem editora.
Portanto, para mim os temas mais comerciais estão encerrados: futebol ("Neura 2004" e "Fado, futebol e farpas, uma aventura psicadélica") e sexo: "Diário Sexual de um escritor frustrado", Ganda Ordinarice, com as coberturas dos Salões Eróticos e o projecto de um livro: "Volta a Portugal em Salões Eróticos",que também não sai dos tacos, por falta de interesse das editoras.
Tenho é de me dedicar ao pingue-pongue do Inatel.
E podem sempre ler-me todos os meses na "Os meus livros".
Em 2008 participarei numa colectânea de poesia: "Poetânea 7". Por acaso com prosa sobre Pessoa, a pedido dos organizadores.
Vários textos alusivos a uma exposição fotográfica de Inês Ramos e José de Deus e um mini-conto à moda dos "15 Desatinónimos para Fernando Pessoa", chmado "Apascentando ninfas".
Grande abraço e bom 2008.

7:51 da tarde  

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